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Intro

A ideia de esticar uma corda até a sua tensão poder ser excessiva e romper é indissociável da sua consequência: no ricochete das suas metades há um silvo que faz antever uma chicotada, um impacto que produz um dano e uma consequência física num qualquer alvo. O mesmo pode ser dito de qualquer dispositivo de equilíbrio incerto, como uma balança, ou um balancé: todo o movimento num determinado sentido implica, necessariamente, um movimento contrário e assim sucessivamente até à dissipação da energia do movimento original. Em todos estes movimentos, no fluxo das suas causas e consequências, existe uma correlação de forças, de tensões e de refluxos orientados pela verticalidade da força da gravidade, pela atração pelo solo. Esta tensão em direção ao chão, que desgasta toda a movimentação horizontal, é, pelo menos para os humanos, o sinal da inevitabilidade do fim, o anúncio ou a permanente lembrança de que tudo é atraído para baixo e de que a finitude é o destino do movimento. Este é a matéria-prima de Gustavo Sumpta (Luanda, 1970) nas várias formas plásticas que desenvolve, desde a escultura, a instalação e as diversas ações que tem vindo a realizar. A exposição que apresenta na Galeria Solar é construída a partir de três projetos de grandes dimensões que estruturam o espaço físico e emocional da galeria. A escultura Levantar o Mundo, 2017, é um dispositivo concebido para uma ação que, no entanto, mantém, na sua ausência, a tensão da sua expectativa em repouso. A enorme prancha de aço depositada sobre um pneu de grandes dimensões intui, na potência da sua escala, o movimento pendular com que o artista a ativa; a instalação Luto, 2020, é um ambiente construído com fitas de vídeo VHS, colocadas como uma cascata de memórias suspensas, cegas e mudas, mas presentes na forma massiva como se estiram, pendentes, pelo espaço, em ondas negras como se uma presença nelas vivesse em permanente desfalecimento; por fim, a escultura Ofício de viver. Ofício de poeta, 2022, é uma parede entrançada de pneus, tensionada na arquitetura do espaço, como se fosse um muro tão potente como frágil. O ponto comum entre estas obras – como também, por diversas formas em relação às restantes, escultóricas, performativas e videográficas – situa-se na forma como juntam dois tópicos: o ar, presente na utilização de pneus e câmaras de ar, inerente à respiração mas também à sua falta, à pressão que mantém a forma sustentada pelo poder do sopro; e o chão no qual os pneus rolam, onde assentam e permitem, pela sua circularidade, o movimento – e, nesse sentido também a gravidade, a atração pelo que está em baixo, que faz pender as memórias desconhecidas das fitas vídeo, todas também olhando para a perda, para a falta. Em suma, para o chão. Como na escultura Herdeiro Universal, 2022, de facto um dispositivo a ser ativado na performance homónima, a temática de Sumpta está sempre associada à perda e à resistência, à falha e à sua exatidão, à antevisão e ao seu caráter decetivo – ou de uma precisão coreográfica. Mais não é do que, em cada momento, encenar a possibilidade de inspirar até ao limite da capacidade do corpo, suster a respiração e, antes do perigo, expirar de uma forma controlada e consciente. E fazer disso um exercício com o peso certo, num tempo dilatado, num equilíbrio leve. Por isso a exposição se chama Sob o Signo do Pneu. Do pneuma. Do enorme peso assente sobre ar. ⬛ Delfim Sardo

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