Para a sua primeira exposição em Portugal, o artista escolheu os filmes "We knew how beautiful they were, these islands" e "All come from dust", criando uma profunda sinergia com o cenário subterrâneo do espaço Cave da Solar - Galeria de Arte Cinemática, um ambiente único construído a partir de pedras sobrepostas. Esta relação simbiótica entre o filme e o espaço instiga um diálogo subtil que escava narrativas ocultas de isolamento, preservação e refúgio.

Em "We knew how beautiful they were, these islands", seguimos de perto a presença espetral de um homem a cavar sepulturas. As suas mãos nuas transformam a terra no local de descanso final de náufragos sem nome. Ele desafia o esquecimento e enraíza os mortos na sua terra natal. As câmaras trogloditas de Matmata, uma região no sul da Tunísia, tornam-se santuários para uma comunidade deslocada, reflectindo o abraço protetor da arquitetura subterrânea, concebida para se misturar harmoniosamente na paisagem e proteger contra a invasão.  O reino subterrâneo torna-se um escudo, isolando as silhuetas frágeis da turbulência do mundo exterior e protegendo-as.

"All come from dust", filmado na mesma paisagem do sul da Tunísia - desta vez em Tozeur - documenta a prática milenar de criar uma torre que emerge das profundezas da terra, um processo enraizado na região e preservado pelos antepassados do artista. Em vez de documentar os passos envolvidos no fabrico de tijolos de terracota na sua ordem correta, Ben Slimane quis captar a singularidade do trabalho artesanal. Permite-nos observar os movimentos hábeis das mãos que transformam a terra. Através da sua câmara, catalisa as forças e as metamorfoses da matéria, bem como a atmosfera cerimonial que a envolve, criando uma aura cosmogónica.

A exposição de Ben Slimane é uma representação alegórica de proteção em que o espaço da Cave da Solar - Galeria de Arte Cinemática é o anfitrião ideal, com o seu abraço de pedra a refletir o refúgio arcaico representado nos filmes. Ao explorar os filmes de Ben Slimane, os visitantes são convidados a mergulhar nas narrativas paralelas dos espaços subterrâneos da galeria do século XV, testemunhando silenciosamente a relação entre os gestos das mãos e as pedras milenares, que ressoam com a sua própria experiência.

O refúgio arquitetónico e as histórias humanas que nele se desenrolam entrelaçam-se, dando forma a fragmentos harmoniosos do tecido narrativo de cada filme. O artista trabalha para expor a profunda ligação entre a terra e os seus habitantes. Nestes dois filmes, desprovidos de diálogos, apenas as mãos trabalham para moldar a terra e preservar a memória: a memória dos migrantes desconhecidos e dos marginalizados, mas também a das habilidades ancestrais que honram a continuidade do toque humano.